Crítica gastronômica não é avacalhação pública
As redes sociais não criaram a maledicência, apenas ampliaram seu alcance. Antigamente era a fofoca no corredor; hoje, é o tuíte agressivo, o post venenoso no blog, a atualização 'polêmica' no Facebook. O fato é que falar mal dá audiência, causa comoção. Enquanto alguns seres humaninhos se sentem mais confortáveis com a própria existência ao verem seu irmão de espécie numa posição de vulnerabilidade, outros celebram os furiosos como se fossem corajosos. Como se tivessem peito pra nadar contra a correnteza da opinião comum. Já eu, penso que gente gratuitamente agressiva precisa de educação, não de likes.
Outro fato: as redes sociais transformaram todo mundo e qualquer um em crítico gastronômico. Celular na mão e… pumba!, foto compartilhada com sua devida legenda 'analítica'. Junte, então, a audiência natural da maledicência com o alcance virtual imediato das opiniões e temoa uma mistura tão explosiva quanto deprimente.
Para se tornar crítico, de qualquer assunto, são necessárias três coisas: estudo, tempo e referencial. A parte do estudo é óbvia: só é possível falar com o mínimo de propriedade sobre algo que se passa a vida tentando conhecer a fundo. O tempo de estrada é necessário para a formação de biblioteca sensorial: aos 20 anos jamais teremos provado tantas coisas quanto aos 40. Jamais teremos viajado tanto. Já o referencial advém, exclusivamente, da união dos dois primeiros itens.
Acho cômico gente que nunca pisou numa destilaria, nunca tomou um drinque em Londres, Nova York ou Berlim, fazendo 'crítica' de coquetelaria. O que dizer, então, de 'críticos' de gastronomia que jamais saíram do país mas escrevem com propriedade sobre culinária italiana, japonesa e francesa? "O melhor carbonara, o melhor negroni, o melhor cassoulet, o melhor hambúrguer, o melhor currywurst" comparado com o quê, exatamente? Com os restaurantes vizinhos de casa? Com a comida da mãe, da sogra?
Mas eu entendo: estudar dá um puta trabalho, consome tempo e dinheiro. É muito mais fácil vociferar verdades absolutas sem se importar em embasar o que se diz. Ter discernimento e avaliar o impacto do que se escreve também não é das coisas mais fáceis porque implica em fazer autocrítica e ter empatia. E os aplausos virtuais por partes dos iguais são tão sedutores…
Opinar não é fazer crítica. A primeira ação se refere a exposição do que se pensa sobre algo, tendo ou não esse pensamento lógica e/ou embasamento; a segunda é derivada de análise comparativa e contexto. Crítica gastronômica não é avacalhação pública: quem procede regularmente assim clama por atenção e, provavelmente, precisa de terapia.
Críticos pontuam falhas e apontam acertos. Sabem que apenas retratam o momento, porque restaurantes são organismos vivos em constante evolução e/ou involução. Entendem que uma refeição não é a verdade absoluta sobre o talento de um cozinheiro: pessoas tem bons e maus dias, afinal.
Sempre duvide de quem ama ou odeia tudo: nenhuma das alternativas é sinal de bom senso.
Mas claro que críticos tem seus lugares prediletos. Podem ser escolhidos por gosto pessoal em determinada cozinha, pela proximidade de casa, pela aptidão do chef, pelo combo comida/ambiente, etc. Os meus lugares favoritos em São Paulo, atualmente, estão listados abaixo. Significa que todos os pratos, em todos os locais, são perfeitos e que você vai amar tudo o que comer? Óbvio que não: nosso paladar é subjetivo e é impossível algo agradar a todos. Significa apenas que, para mim, neste instante, essas casas estão em seu auge e que a probabilidade de fazer uma refeição prazerosa é altíssima.
Não são "os melhores" de São Paulo: não acredito neste termo pois, para usá-lo com propriedade, precisaria conhecer TUDO.
São, isso sim, os que mais me agradam no meu momento de vida, no qual procuro mais frescor, mais vegetais, mais tempero, mais cores e mais leveza.
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