Sustentável é o novo gourmet
No mundo gastronômico, está na moda falar em sustentabilidade. Por um lado, é ótimo: precisamos MESMO ter noção da onde vem e como é produzida nossa comida para podermos fazer escolhas conscientes. Por outro lado, porém, isso se tornou um cacoete pseudohispter: a maior parte das pessoas, inclusive aquelas que dizem ter estabelecimentos sustentáveis, não sabem do que sustentabilidade se trata.
Sustentável é o novo gourmet.
Restaurantes, lanchonetes, bares e afins são, em seu cerne, nada sustentáveis: há perda de insumos em cada pré-preparo (colocar no padrão da cozinha, usar apenas uma parte dos legumes e verduras…), desperdício de comida (o que sobra nos pratos, o que foi feito porém não vendido…), grande uso de água, menus que utilizam os mesmos ingredientes o ano todo (e quando não se segue a sazonalidade, o mundo vegetal precisa de muito mais água/hora-homem e, muitas vezes, agrotóxicos para crescer), grande produção de lixo… e a lista segue.
Então como tornar um restaurante menos insustentável? Aí é que entra a trabalheira. Uma imensa e louvável trabalheira.
Para ostentar esse 'título', o estabelecimento teria que comprar a maior parte dos insumos de pequenos produtores locais (o que evita grandes trajetos de caminhão/avião e ajuda a economia da região), primar por ingredientes orgânicos (com ou sem selo) ou com o mínimo uso de defensivos (que, como sabemos, envenenam terra, rios, mares e pessoas), oferecer poucos alimentos de origem animal (para entender a razão, clique aqui) e, quando oferecer, que sejam provenientes de animais criados soltos (bem estar animal está intimamente ligado a sustentabilidade), ter composteira de lixo orgânico, disponibilizar água filtrada para os clientes (você já imaginou a quantidade de água usada para a produção de cada garrafa de plástico? Isso sem contar a poluição gerada por elas)… e a lista segue.
Ou seja: muita gente diz fazer e quase ninguém faz de fato.
Diz fazer porque, sim, pensar no impacto global da cadeia de produção e distribuição de alimento é crucial. Quase ninguém faz porque é uma atividade desgastante, diária e é preciso talento: criar dezenas pratos, todos os anos, usando os ingredientes disponíveis em cada época é desafiador e tira muito cozinheiro da doce zona de conforto tomate-filé mignon-salmão-abobrinha.
Dois restaurantes, ambos em São Paulo, merecem todo meu respeito em se tratando de levar o conceito e prática de sustentabilidade para a gastronomia: Enoteca Saint VinSaint e Corrutela. Um, acabou de fazer dez anos.
O outro, acaba de ser inaugurado.
Sob o comando da nutricionista e sommeliére Lis Cereja, a Enoteca tem carta exclusiva de vinhos naturais (ela é uma das maiores especialistas no tema no Brasil), 100% dos ingredientes são orgânicos e sazonais – muitos deles, como ovos, verduras e leite de cabra produzimos em sua chácara -, o desperdício zero é um alvo constante (há pão, por exemplo, que leva borra de café e o nhoque de abóbora usa casca, polpa e sementes) e grande parte do que é servido vem do reino vegetal. Para tirar qualquer dúvida dos clientes, um quadro, bem no meio do salão, expõe o nome de cada item com o seu devido produtor.
O novíssimo Corrutela, com o chef Cesar Costa a frente da cozinha e do conceito, tem seu próprio moinho de trigo, cacau e milho, que se transformam em pães fragrantes e primorosos, chocolate usado nas sobremesas e polenta que mantém a alma do grão. O cardápio tem itens alterados semanalmente, de acordo com a oferta de insumos. Todo o lixo orgânico da cozinha vai para uma composteira exposta no salão. Os fornecedores são, em sua maioria, pequenos e, muitos, orgânicos.
E ambos os restaurantes tem algo essencial: ótima comida.
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