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Como os restaurantes definem os preços do menu? O que é custo-benefício?

Ailin Aleixo

11/10/2018 11h18

Comer em restaurante anda caro pacas. Seja os 'por quilo' ou os bacanões, parece que os preços do menu não acompanham os dígitos da sua, da minha, conta bancária. Isso acontece por que os donos de restaurantes tem um baita lucro, colocam margens surreais e 'gourmetizam' qualquer tranqueira só pra poder cobrar horrores.

Não, isso não é verdade.
O vídeo acima, que fiz para o meu canal de YouTube, aborda o tema do ponto de vista de quem mais o entende e sente na pele: o proprietário.

Restaurantes, lanchonetes, bares, padarias e quaisquer estabelecimentos que vendam comida pronta pra consumo precisam incutir nos preços que praticam uma quantidade imensa de itens: custo com ingredientes, gás, luz, aluguel, IPTU, salários, material (copos e louças que quebram, talheres que são roubados, etc), gás, ISS, Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS),  Imposto de Renda de Pessoa Jurídica (IRPJ), Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), PIS/Cofins, Contribuição sindical e INSS e FGTS dos funcionários… a lista é beeeeeem extensa. Por isso é tão absurdo o discurso "mas eu faço em casa por um terço do preço!". Em casa não pagamos chef de cozinha, equipe de limpeza, garçom, cumin. Em casa não pagamos segurança, seguro, troca de equipamentos por desgaste. Em casa não há uma dezena de profissionais envolvidos no preparo daquele alimento como chef, nutricionista, confeiteiro.

Alguns pontos precisam ser conhecidas por nós, consumidores, para podermos criticar preços com propriedade. A primeira delas é: se quisermos comer a mesma coisa o ano todo, pagaremos caro.

Salada de tomate 365 dias por ano.
Abacate em julho.
Brócolis em janeiro.
Por mais que esqueçamos, frutas, verduras, legumes, peixes e frutos do mar são sujeitos a sazonalidade, ou seja, tem época. O fato dos mercados oferecerem tudo durante os 365 dias do ano não significa que seja normal ou natural: quando vemos itens fora de estação lotando as prateleiras, podemos ter certeza de que vieram do outro lado do mundo ou consumiram muito mais água, mão de obra e agrotóxicos para serem produzidos – logo, custarão mais. E, obviamente, custarão mais também para o restaurante que os usa. Cabe a nós passar a valorizar os ingredientes da estação e de cardápio de acordo com a sazonalidade e cobrar que os restaurantes mudem o menu sejam criativos com seus cardápios.

Outro equívoco é achar que preço alto é igual a custo-benefício ruim: estes conceitos não são interligados. Pelo menos, não sempre.

Sanduíche de queijo e presunto com tomate, na baguete, suco de laranja e café numa padaria de bairro, em São Paulo: R$ 35
Menu degustação de seis etapas em um restaurante duas estrelas Michelin, em São Paulo: R$ 190.

O primeiro exemplo tem valor final baixo mas péssimo custo-benefício: queijo industrializado, presunto com conservante e corante e proteína de soja, baguete feita de pré-mistura cheia de aditivos e café de péssima qualidade, servidos num ambiente barulhento e com garçons impacientes.
O segundo exemplo tem valor final alto porém traz o melhor da gastronomia brasileira, usa apenas ingredientes de pequenos produtores, emprega profissionais altamente capacitados e possui ambiente agradável e serviço impecável. Ou seja, ótimo custo-benefício.

Caro e barato dizem respeito a quanta grana você tem para adquirir determinado item.
Custo-benefício relaciona-se com o proveito que tirará ao comprar algo, independente do valor em dígitos.
Ou seja, uma coxinha de R$ 6 pode ter um péssimo custo-benefício por ser oleosa, ter pouco recheio, massa dura, etc, enquanto um carbonara de R$ 50, feito com massa artesanal, ótimo queijo pecorino, guanciale artesanal, pode ser um tremendo custo-benefício. Uma excelente coxinha de R$ 6 também pode ter  custo-benefício muito melhor do que um carbonara medíocre de R$ 30…

Importantíssimo também é comparar coisas comparáveis.

Parece óbvio, mas não é. Infelizmente.
Vivo ouvindo frases do tipo "Acredita que uma lanchonete no Itaim cobra R$ 20 num cachorro-quente! O do cara da van perto de casa, lá na Penha, é R$ 10!".
O cidadão dono da lanchonete no Itaim paga aluguel e IPTU altos, justamente por estar num bairro central e considerado nobre. Tem equipe e, logicamente, paga salário, auxílio-transporte e encargos trabalhistas.
Comprou móveis de salão e de cozinha.
É fiscalizado pela prefeitura.
O cidadão da van não paga aluguel e trabalha sozinho.
Não arca com imposto sobre venda porque não sofre fiscalização.
Mesmo se servissem produtos idênticos – salsicha, pão, mostarda e catchup das mesmas marcas -, o preço do sanduíche do Itaim teria que ser, automaticamente, mais alto do que o da Penha por que os custos são muito maiores. Caso contrário, o negócio iria à falência.

Sim, todos os dias são inaugurados negócios ligados a alimentação pelo país. Porém o dia-a-dia é tremendamente mais complicado do que parece, os impostos muito maiores e o lucro, muito menor. Nós, como consumidores, devemos valorizar o que é bom – independente de custa R$ 10 ou R$ 100 – e entender que para criticar algo com propriedade, é preciso compreender o que se critica.

Sobre a autora

Ailin Aleixo é jornalista, e criadora do mais influente site de gastronomia e turismo gastronômico do país (Gastrolândia) e do canal de jornalismo gastronômico no YouTube, #ptdk. Ocupou o cargo de editora-executiva das revistas VIP, Viagem e Turismo, Playboy e Alfa. Desenvolveu o projeto editorial do roteiro de gastronomia da revista Época São Paulo (2007). Apresentou boletim diário sobre gastronomia nas rádios CBN (2008) e AlphaFM (entre 2015 e 2016). É curadora do FOOD FORUM, o maior fórum sobre comida do Brasil, e palestrante.

Sobre o blog

Foodie-se não é um blog de tendências gastronômicas.Nem de crítica de restaurantes.Nem de novidades, nem de prêmios.Foodie-se é um blog sobre comida e toda sua cadeia: campo, fábrica, pequenos produtores, grandes produtores, bares, restaurantes, animais, plantas, orgânicos, convencionais, chefs de cozinha...

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